Um Lugar ao Sol, de George Stevens
O carteiro não toca sempre duas vezes
(a propósito de Matchpoint, de Woody Allen)
Ainda não considero Matchpoint o Woody Allen da década, até porque esta ainda está a meio e espero sempre muito do homem que realizou Manhattan ou A Rosa Púrpura do Cairo. Mas gostei. Para além de dar a ver o loft com vista sobre Tamisa para onde me mudaria se fosse contemplada com o Euromilhões, Matchpoint é um drama com tese, por sinal bem defendida.
Penso, no entanto, que a narrativa se arrasta de forma pouco menos do que monotóna até aos 15 minutos finais. Uma paixão sexual irresistível e um adultério que, a determinado momento, se torna demasiado inconveniente para os planos dos intervenientes nesta história, podem ser elementos interessantes, mas Woody Allen conta-a à imagem e semelhança de todos os outros romances e filmes sobre o assunto. Os actores estão irrepreensivelmente dirigidos, a realização é segura, Londres extremamente fotogénica, mas a verdade é que, ao contrário do que me acontece na maior parte dos outros filmes do realizador, não me sentia empolgada. Até aos 10 minutos finais quando Allen apresenta a sua tese - por amor aos que ainda não viram, não digo qual é - , encerrando a elipse da narrativa.
Matchpoint, co-produzido pela BBC, é o mais europeu dos filmes de Woody Allen. Mas se, de alguma forma, pairam ali os «fantasmas» de Fanny Ardant e Gérard Dépardieu em A Mulher do Lado, de Truffaut, nem por isso deixei de associar a obra de Allen à que me parece ser a sua genealogia americana, nomeadamente Um Lugar ao Sol, obra-prima de George Stevens protagonizada por um triângulo de ouro formado por Montgmory Clift, Elizabeth Taylor e Shelley Winters, e O Carteiro Toca Sempre Duas Vezes, de Tay Garnett, com Lana Turner e John Garfield. A diferença está justamente no final que não vos devo contar. Nos anos 40 e 50 , quando aqueles filmes foram realizados, o cinema contava histórias morais. Hoje - sabe- se - o carteiro nem sempre toca duas vezes.