Friday, March 31, 2006



Breakfast on Pluto, de Neil Jordan

Filme maravilhoso; banda sonora inesquecível para quem - como eu - ama os 70's: The Rubettes, Don Partridge; Harry Nilsson; T-Rex; Van Morrison; Patty Page e, sobretudo, «The Windmills of Your Mind» por Dusty Springfeld. Senti-me estupidamente orgulhosa por me lembrar dessa década em que os bons e os maus se confundiam menos do que hoje.


Thursday, March 30, 2006


E quando tudo parecia correr mal, eis:

a) as mãos habílissimas da Ana Rodrigues a fazerem maravilhas no meu cabelo;

b) um elogio sincero e entusiástico ao trabalho que me ocupou a semana inteira;

c) Stéphane Grappelli, A Froggy Plays in London Town;

d) um convite para ir à Cinemateca, «degustar» Mamma Roma, de Pasolini (v. foto);

e) an old good infatuation;

Wednesday, March 29, 2006


É oficial: tenho uma nova paixão. Ando a ler tudo o que posso sobre a cultura chinesa.

Monday, March 27, 2006

Contigo

Sou eu, sou eu que não durmo,/
Contigo nos sentidos./
Sinto-me caminhar sobre as águas/
do meu corpo - não sejas queimadura/
nem boca do deserto/

Nenhum amor é estéril,/
um filho/
pode ser uma estrela ou ser um verso

Eugénio de Andrade

Thursday, March 23, 2006

Álvaro Cunhal e eu

Era uma menina. Tinha a tal ideia romântica do jornalismo que, em 4 ou 5 anos de profissão, só me tinha dado coisas boas. Propus-me entrevistar Álvaro Cunhal e, apesar da petulância que isto hoje me parece, fui aceite. Seguiram-se muitos telefonemas para a sede do PC, vários faxes (estávamos em 1995, não se usavam mails) e, finalmente, uma conversa prévia.
Lá fui, sem medos, sempre receei mais os dias que se arrastam mansa mas torpemente iguais do que os grandes e súbitos desafios. Álvaro Cunhal queria, porventura, avaliar a desconhecida. Eu disse-lhe ao que ia - falar de literatura - e acrescentei, talvez mais fragilmente do que o necessário, que o meu pai, velho representante da classe operária, toda a vida se sentira representado pelo Partido Comunista e pela liderança de Cunhal. Combinámos as regras, que ambos cumprimos escrupulosamente e uma semana depois fez-se a desejada entrevista. Foi publicada no JL a 15 de Fevereiro de 1995 e, se outros méritos não tiver, fica para a petit histoire destas coisas como aquela em que o político assumiu ser também o escritor Manuel Tiago.
Vêm estas recordações a propósito do livro do jornalista Miguel Carvalho, Álvaro Cunhal - Íntimo e Pessoal (edição Campo das Letras). Pensado como um dicionário afectivo, este livro reune citações de entrevistas que, ao longo das décadas, o político foi concedendo aos órgãos de comunicação social portugueses. Amavelmente, o Miguel introduziu algumas citações desse meu momentozinho à Edward G. Murrow. Como esta em que explica a origem do seu pseudónimo, tão famoso como ele: «Tenho uma irmã, 14 anos mais nova do que eu. Antes dela nascer, os meus pais fizeram uma lista com nomes. Uma lista para nomes de meninos e outra para meninas. Quando pensei na publicação, fiz uma lista de nomes, neste caso só de meninos, e acabei por me pronunciar por este». Fez-se muitas saudades - de Cunhal, da minha juventude e de um tempo em que o jornalismo me parecia bigger than life.

Wednesday, March 22, 2006



Mrs Henderson Presents

Passou injustamente despercebido pelas salas de cinema portuguesas, mas é, para mim e para um dos frequentadores deste blog, um dos filmes do ano. A grande Judi Dench foi nomeada para o Oscar, Bob Hoskins também o deveria ter sido e a realização de Stephen Frears é empolgante. O que não admira. No currículum deste cineasta inglês constam, entre outros, My Beautiful Laundrette; Ligações Perigosas e Dirty Pretty Things.

Meio musical, meio comédia, Mrs Henderson Presents passa-se numa Londres sufocada pelo Blitz e conta a história verídica de uma viúva upper class que decide investir no show-bizz o dinheiro e o tempo livre deixados pelo falecido. A banda sonora é tão deliciosa quanto as picardias trocadas por Judi Dench e Bob Hoskins.

Tuesday, March 21, 2006



Lágrimas

Às vezes são fundamentais para arrumar a vida. Um beijinho à Inês e à Patrícia que as recolheram. Vou usá-las para regar o futuro.

Friday, March 17, 2006

Poemas para o fim-de-semana

Este foi o livro que acompanhou as viagens da semana: Malva 62, de Daniel Maia-Pinto Rodrigues. É uma poesia desconcertante, às vezes bela, que ainda há pouco li ao telefone ao meu cúmplice favorito. Agora partilho convosco alguns dos poemas que sublinhei, desejando-vos, desde já, um bom fim-de-semana.
1.
«Insiste em não compreender/
ser eu aquele que pinta/
a poeira no fim da luz/
aquele que no parque finge/
contornos perfeitos de cisne»
2.
«Pertencera a um grupo de malta rebelde./
Desenvolveu alguns programas de rádio/
e também, parece, algumas encenações teatrais./
Todavia o seu projecto principal era o de mudar o mundo./
Ao que eu lhe disse que o meu grande projecto/
Foi sempre o de que o mundo não me mudasse a mim.»
3.
«Gostava muito de te ver, Mafalda/
mas ao mesmo tempo não fazer/
que avançasses um passo/
ao verão imaginário em que te conheci.»
4.
«Tu és o bonito príncipe de ti.»

Thursday, March 16, 2006


«It's the press, baby! And there's nothing you can do about it!»
Há entre o cinema norte-americano e o jornalismo uma velha cumplicidade. Good-Night e Good Luck é um bom exemplo dessa tradição algo romântica em que o jornalista é apresentado como um herói que defende a democracia contra interesses obscuros, pondo muitas vezes em risco a sua própria segurança. A Cinemateca Portuguesa já dedicou um ciclo (e um belo catálogo) ao tema, mas eu gostaria de destacar três filmes muito diferentes que fazem parte do meu imaginário. O primeiro, cujo fotografia acima reproduzo, é Os Homens do Presidente. Realizado em 1976 por Alan J. Pakula, reconstitui a empolgante investigação que deslindou o caso Watergate e levou, por obra de dois jornalistas do Washington Post, à demissão do Presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon.
Os outros dois são interpretados por esse autêntico símbolo da integridade a toda a prova que foi Humphrey Bogart: Deadline USA (Richard Brooks, 1952) e The Harder They Fall (Mark Robson, 1956). Este último - derradeiro papel do actor antes da sua morte, ocorrida um ano depois - conta como um jornalista desportivo luta contra os gangsters que precipitam a queda de um boxeur caído em desgraça. Deadline USA ocupa-se directamente do papel da imprensa no combate ao crime organizado. Bogart interpreta o editor de um jornal em agonia que decide terminar em glória, denunciando as actividades criminosas de um gangster com ambições políticas. O final é apoteótico. Com o último número na rotativa, o editor põe termo às tentativas de silenciamento do denunciado, dizendo-lhe esta frase inesquecível (com aquela aura de verdade que Bogart punha em tudo o que dizia): «It's the power of the press! And there's nothing you can do about it!»

Tuesday, March 14, 2006


Sim, era o meu favorito para os Oscars, mas eu tenho mesmo um fraco por filmes em que os jornalistas são charmosas criaturas incorruptíveis capazes de salvar o mundo.

Teatro de olhares

«Um olhar desencadeia uma paixão, um assassínio, uma guerra.»

Robert Bresson


Sei que estás aí, a desenhar o mapa da próxima aventura. Fumas um cigarro, um dos 50 deste dia sem nada de especial. Sinto que estás mesmo aí, talvez à distância do passo que não dou. Adivinho-te a presença, mesmo sem levantar os olhos para o confirmar. E se o fizesse? Ver-te-ia a observares-me na curta fracção de tempo em que te sustentasse o olhar tão seguro que chega a parecer frio. Sim, percebo agora, é frio, como raramente o é em olhos tão escuros.
É assim há anos, um jogo de gato e rato que se perpetua no silêncio. E se um dia…? ... E se um dia, esquecida da austeridade católica herdada de minha mãe, eu ignorasse que uma senhora não deseja, concede? Se quebrasse este aquário à força duma única palavra ou dum sorriso? O que aconteceria? Se uma borboleta que bate as asas na China provoca um tufão nos antípodas, o que poderá fazer o passo adiante que falta a um de nós?
Este jogo é tão antigo que o integrei na rotina quotidiana. A sedução de todos os dias nos dai hoje para que amanheçamos menos tristes. Eu começara por embirrar solenemente contigo. Aliás, confundira-te com outro, de má fama, que, pela mesma época, chegara à empresa onde trabalhava há anos. Seguiu-se que, desfeito o equívoco, me obstinei na antipatia: embora não apreciasse os executivos, todos impecavelmente vestidos de igual, aquela maneira descuidada de te vestires pareceu-me encenação de poseur, sobretudo quando às calças largueironas somavas um boné de pala, perfeitamente dispensável em edifício pouco exposto à luz solar. Vim a esquecer-te como só é possível num local onde, diariamente, centenas de pessoas conseguem cruzar-se sem se cumprimentar. Via-te sem te ver até ao dia aziago em que uma das minhas colegas decidiu apaixonar-se por ti à distância.

- Aquele?! Giro?! Estás doida?

A outra enaltecia-te os encantos – a presença forte, a curva do pescoço, os ombros largos, o cabelo denso, a maneira de acender o cigarro.

- Sim, talvez, mas vamos ao que interessa…

- Acontece, querida Ana, que ele não me liga a mínima. Acho que ele gosta é de ti.

- Estás mesmo doida.

Estaria? A ideia fez o seu caminho na minha imaginação. Dei por mim a alvoraçar-me secretamente à tua passagem, a preparar de véspera a toilette, a fazer-me notada, a fazer que me notasses. E notaste.
O nosso jogo adensou-se nos meses que se seguiram. Às vezes, a atracção adquiria a forma da hostilidade surda, totalmente alheia à ternura. Surgias e, nesse preciso instante, sentia-me a menina frágil que fora toda a vida. Desaparecias do meu horizonte e voltava a seguir o meu rumo tão bem delineado como sempre acontecera. Tinha tanto medo de te encontrar sem aviso que ficava agarrada à cadeira como se tomasse um pânico de morte.
Um dia houve em que me seguiste onde quer que eu fosse. Sozinhos no elevador, olhavas-me com essa insistência selvagem que te caracteriza e fui tomada de pânico. Um minuto, o minuto em que li todas as letrinhas pequenas do impresso que levava nas mãos, pareceu-me uma eternidade. A porta acabou por abrir-se para meu alívio, mas havia neste alívio o travo amargo das coisas não acontecidas. Se eu tivesse correspondido a esse olhar, em que zona remota do planeta teria acontecido o tufão?
A pequena cobardia não ditou o final desta, chamemos-lhe assim, relação. Os meses seguintes prolongaram-se do mesmo modo. Ninguém suspeitava. Talvez nem tu, pensava eu nos momentos que tanto mistério me alimentava as dúvidas. Mas a longevidade do teatro de olhares acabou por me alimentar o romantismo. Com a cabeça cheia de filmes, ponderei que, se tal atracção resistia para além dos vulgares prazos de validade destes fenómenos, era porque talvez fosses o tal do gostinho especial, a laranja amarga e doce, meu poema, aquilo a que a imprensa espanhola, sempre tão colorida, atribui o título de «príncipe azul». E se, assim fosse, só a minha timidez nos impedia de consumar tão risonho destino? Resolvi falar-te. Não foi uma declaração, não foi uma demonstração de coquetterie, apenas um gracejo que tivesse a arte de quebrar o aquário. Lembro-me que riste, mas não levantaste os olhos. Desta vez, contra o teu costume. Eu devia ter percebido imediatamente, mas, lamento, tardei uns dias a perceber que gostavas de andar em círculos no aquário e que gostavas de me ver reproduzir-te o movimento.
O teatro de olhares fechou o pano nesse mesmo dia. Não houve mais gestos esboçados, encontros furtivos que não o chegavam a ser, silêncios como campos minados. Agora apenas bastariam uns meses para que nos voltássemos a cruzar sem nos vermos. O mistério fora apenas o belo nome do nada.

Wednesday, March 01, 2006

foto de MJM


Mais saudades da Primavera/Verão

20 de Maio de 2005, final da tarde, fumava um cigarro à beira do Danúbio enquanto o Cristóvão fazia fotos à séria. Peguei no telemóvel e, zás, fixei como pude o esplendor daquele final de dia. Jantámos depois num restaurante lindo, um barco chamado «Spoon», e voltámos à base a cantar, já bem bebidos.

foto de MJM
Firenze, Junho de 2005




Ontem espreguiçámo-nos como gatos ao sol. Sei que tens tantas saudades do Verão como ganas de futuro. Para ti, esta fotografia da Piazza de la Signoria, em Florença, numa noite muito quente do Verão passado.