Monday, February 27, 2006


A Sombra do Vento
Falo muito mais de filmes do que livros neste blog, mas a verdade é que uns como os outros são igualmente importantes na minha vida. Na semana passada produziu-se uma espécie de piccolo miracolo e assentou na secretária da minha triste repartição um livro maravilhoso. Intitula-se A Sombra do Vento e é da autoria do catalão Carlos Ruiz Zafón. O facto de aparecer no mercado português recomendado por vários prémios não me impressiona por aí além, mas a verdade é que, mal o comecei, percebi que se tratava de um livro especial, muito para além dos qualificativos comercialóides que a editora pespegou na faixa que o envolve. Ao contrário do que ali se sugere, A Sombra do Vento não é um pastiche eficaz de García Márquez, Umberto Eco e Jorge Luis Borges. É uma história lindíssima (e contada sem presunção) sobre um rapaz - Daniel Sempere - que se apaixona na mesma (des)medida pelos livros de um escritor misterioso e por uma mulher cega, dez anos mais velha. Por causa de ambos, sofrerá ameaças e viverá perigosas aventuras numa Barcelona mal refeita das feridas da Guerra Civil. Primorosamente escrito, devolve-nos o prazer das grandes histórias românticas e dos heróis cuja ética está na proporção inversa às suas poucas cautelas.

Friday, February 24, 2006

O mistério (o começo de uma história ou talvez não)
Ela sabe que ele está mesmo ali. Com o próximo cigarro entre os dedos, a delinear o mapa duma aventura. Olha-a com insistência e não disfarça. Ela baixa os olhos porque, por mais que subverta a ordem dos dias, há uma parte dela que herdou a austeridade católica da mãe e da avó – uma senhora não deseja; concede. Pode decifrar o mistério se der um passo em frente. Está mesmo ali, ao alcance de uma única palavra, mas valerá a pena? Se um dia os seus olhos forem apenas peixes (não verdes, como no poema do Eugénio, mas peixes banais e quotidianos), o que restará deste erotismo alimentado pelo mistério? E se, numa destas manhãs, ela não descer o olhar à sua passagem?


A semana foi diabólica, horripilante e tenho corpo e alma a pedir descanso. Embora não tenha o consolo de uma vaca tão carinhosa como a que protege o sono desta menina, desejo-vos um óptimo fim-de-semana.

Monday, February 20, 2006



Luchino Visconti
(Milão, 1906 - Roma, 1976)


Galeria viscontiana

Como já compreenderam os habitués deste blog, para mim, não há realizador que se compare ao italiano Luchino Visconti.
Numa tentativa de converter alguns espíritos mais renitentes, aqui deixo algumas imagens poderosas. Senhoras e senhores, eis um mundo feito de paixões avassaladoras





Friday, February 17, 2006



O Segredo de Brokeback Mountain, de Ang Lee

Intimista e delicada, esta é tanto uma obra sobre o tabu da homossexualidade na América profunda dos anos 60 como sobre a tragédia de qualquer ser humano, esmagado por uma sociedade que o espartilha violentamente. Herdeiro de uma cultura que venera as forças da Natureza (em particular a montanha e a neve, como o testemunha a tradição artística chinesa), Ang Lee contrapõe a esse espartilho a Natureza, majestosa na sua semi-eternidade, que proporciona a estes homens a ilusão de uma vida sem culpa.
Ao longo dos anos, ambos – Jack Twist e Ennis del Mar – pagarão todas as facturas que o seu pequeno mundo lhes vai apresentando: concordarão em casar com as mulheres que os escolhem, terão crianças com elas, representarão, compenetrados, o papel de macho dominante, mas voltarão todos os anos à montanha em que se conheceram, no Verão de 63, querendo prestar tributo ao seu amor perdido. Para ambos, este lugar adquiriu uma dimensão mágica, onde, por momentos, o impossível se torna realidade. O impossível – dizemos – porque, pelo menos a um deles, este amor nunca deixará de parecer fenómeno bestial que importa silenciar, tal como o sofrimento da mulher com quem casou ou os pedidos de atenção da namorada e das próprias filhas. Criados na mais austera (porque não mesmo, na mais violenta) educação da masculinidade, estes dois homens ver-se-ão confrontados com provas consecutivas à sua identidade. Inteligentíssimo, Ang Lee não cede a estereótipos fáceis. Tal como fizera em Tempestade de Gelo (o filme de 1997 em que habilmente escalpeliza o mito da família média norte-americana), desfia, com mão segura, as pequenas cobardias, mais sugeridas do que ditas, que compõem esta tragédia. Num tempo lento, porventura difícil de vender numa época em que o cinema vive de montagens cada vez mais velozes, Ang Lee faz estilhaçar vários mitos – o de uma identidade masculina à prova de dúvidas, mas também todas as pequenas fortalezas que construímos, vida fora, com o único propósito de nos escondermos.

Thursday, February 16, 2006

«Não consigo escrever. Sai-me tudo negro.»

Leo Macías, La Flor de Mi Secreto, Pedro Almodóvar

Monday, February 13, 2006

Viana do Castelo, Setembro de 2005 (foto de MJM)

Cinco sirenitas te llevarán/
por caminos de algas y de coral/
y fosforescentes caballos marinos harán/
nuna ronda a tu lado/
Y los habitantes del agua van a nadar/
pronto a tu lado.

Alfonsina Storni
Rio Lima, Viana do Castelo, Setembro de 2005 (foto de MJM)


Tanto mar!

Estou fechada na «repartição». Estarei fechada na «repartição» por várias horas mais. De repente, lembro-me de que, há uns anos largos, uma bruxa me disse que só seria feliz perto do mar. Não si se a senhora era competente, mas, a tal lembrança, fiquei com sede de horizontes largos.





Adenda às manias anteriormente referidas:

Para terror de candidatas a sogras, tenho também a mania de dançar pela casa enquanto me ocupo da arrumação da mesma. Ataca sobretudo aos sábados e domingos de manhã.

Thursday, February 09, 2006

Cinco manias & tiques
À conta de amigos bloggeiros muuuuito curiosos, esta semana de «Je ne veux pas travailler» está demasiado narcísica para o meu gosto. Desta feita, Miss Engajada desafiou-me a enumerar cinco manias muito minhas:
1) Café
O cheiro, o sabor, os objectos em que é feito e servido fascinam-me. Logo de manhãzinha, pareço uma sonâmbula guiada pelo seu aroma.
2) Jornais e revistas
Sobretudo ingleses, espanhóis e franceses. Compro mais do que alguma vez conseguirei ler.
3) Não dar «graxa»
Repugna-me, embora saiba que deveria fazer mais charminho para cima do chefe.
4) Viagens
Sou viciada e gasto nelas mais dinheiro do que devia.
5) Rir
Muito riso, pouco siso, não é?

Amanhã à noite, no Nimas, em Lisboa, acto de rendição absoluta perante um dos filmes mais sublimes de todos os tempos: Il Gattopardo, de Luchino Visconti.

Wednesday, February 08, 2006

A pedido da Pé (e só por ser para ela) aqui vão as respostas ao confessionário

4 empregos/trabalho que já tive: Alimentar a vaidade dos outros; aturar gente histérica; ouvir os desgostos alheios e calar os meus; ser muito feliz apesar destes.

4 filmes que consigo ver vezes sem conta: O Leopardo; O Fantasma Apaixonado; Casablanca e Um Amor Inevitável (na verdade, são muitos mais)

4 sítios onde vivi: Sou uma nómada incorregível, mas casas a sério só tive duas: a dos meus pais, em Vila Franca Xira, e a minha, em Lisboa.

4 séries de tv que não perco: Sexo e a Cidade; Ally MacBeal; Upstairs, Downstairs; Cosmos

4 sítios onde passei férias: Vila Nova de Milfontes, País Basco, Londres, Amsterdão.

4 pratos preferidos: Sapateira recheada (na Portugália), feijoada de marisco, o meu bolo de chocolate, cozido à portuguesa do Restaurante «Também Quero», em Benfica, Lisboa.

4 sítios onde gostava de ir em breve: Saint Malo e Mont Saint Michel, em França, com o meu «maninho»; Nova Iorque com amigas; Cornualha com «cara-metade»; Vila Viçosa.

Tuesday, February 07, 2006



Chema Madoz em Madrid

São fotografias surrealizantes que convidam à criação de histórias (talvez porque o autor não as submeteu ao «açaime» das legendas). Está patente até 21 de Maio, no edifício da Telefonica, em Madrid (Gran Vía, 28) e vale muito a pena. Também gostaríamos que alguma instituição portuguesa mostrasse a Portugal a extraordinária obra deste fotógrafo nascido em Madrid em 1958. Penso sobretudo num blogger amigo, preocupado com o funcionamento das coisas, que deliraria com uma exposição de Madoz...



Thursday, February 02, 2006


Fim-de-semana

É uma das minhas pátrias e vou atravessar meia Península, noite dentro, para lá passar o fim-de-semana. Serão quase 48 horas para esquecer as mediocridades do quotidiano. Haverá muito frio, claro, mas também caminhadas de cara ao vento, livros e sons novos, um não acabar de palavras, uma cascada de gargalhadas, maus cafés, copas a mais, rios de mimo, nenhum sono, energias regeneradas para enfrentar várias semanas de cinzentismo. «Madrid me mata?» Não, Madrid devolve-me a alegria dos dias por viver.

Wednesday, February 01, 2006


Folhetim

E não se esqueçam de espreitar mais um capítulo do folhetim «Um literato em alpercatas - Andanças e desandanças de um intelectual de esquerda na Lisboa do século XXI». Será desta que Palmito lançará a alpercata ao ar? Você decide em literatoemalpercatas.blogspot.com.