Friday, July 15, 2005


Não tenho um Citroen, como o que, no anúncio, vinha associado a esta canção dos Pink Martini. Mas acordo muitas vezes com esta disposição. «Je ne veux pas travailler/Je ne veux pas dejeuner» and so on and so on... Não me apetece matar, com a regularidade imposta pela rotina, o mistério primordial da literatura, do cinema, das artes e das ideias. Não me apetece dissecar um filme, um livro, uma declaração com a frieza das análises económicas que hoje se usam. Ainda há surpresas? Há. Mas, para elas - ó grande injustiça - não é preciso trabalhar. Acontecem, aparentemente vindas do nada. Há oito dias, estava numa das cidades de que mais gosto - Madrid - com uma das pessoas mais importantes da minha vida. Melhor era impossível. Ou talvez não...
Fomos ao Teatro Español ouvir a Martirio. Plateia cheia. Olho para a fila ao lado e vejo Penélope Cruz e Pedro Almodóvar. A menina é jeitosa, mas a sua presença não me suscita qualquer interesse especial. E, no entanto, o realizador de Habla con Ella torna-se um espectáculo dentro do espectáculo. Como num caleidoscópio, «viajo» para o princípio daquele filme e sinto-me Benigno a estudar a emoção de Marco Zaluaga enquanto ambos vêem Pina Bausch. Almodóvar não me desilude. Quando Martirio ataca uma copla mais sofrida, o realizador puxa do lenço e sacode uma lágrima furtiva. Sinto-me reconfortada, no meu inocente voyeurismo. Há coerência entre o homem e a sua obra.

2 comments:

sotavento said...

Boas vindas a um novo blog que tão bem começa - Almodovar!... :)

maria joão martins said...

Muito obrigada!
Visitarei sotavento com a curiosidade toda desperta.